CODFISH WATERS

Reagobama

Posted in Estados Unidos by António Luís Vicente on 3 Março, 2008

 

Christopher Caldwell escreve no Financial Times deste fim-de-semana um excelente artigo sobre as diferenças entre Obama e Clinton (oferecendo também ele uma almofada a Obama) e pega num tema que tem vindo a ser recorrente nos últimos meses: a relação entre Obama e Reagan.

To read Mr Obama’s political autobiography, The Audacity of Hope, is to see an interest in Reagan that borders on fascination. “I understood his appeal,” Mr Obama writes.

O argumento é que Obama, tal como Reagan, não esconde a sua ideologia. Em 1980 o candidato republicano conseguiu atrair milhares de votantes independentes e democratas sem precisar de fazer um discurso ao centro. A eleição de Reagan contrariou a tese (da rational choice theory) que defende que um candidato tem que fazer campanha ao centro e “capturar” o votante mediano para ganhar eleições. 

O argumento até é interessante, mas parece-me prematuro. Pode ser que Obama consiga seguir os passos de Reagan e “violar” mais uma vez as regras normais que conduzem a uma vitória eleitoral – se alguém está em posição de o fazer é ele. Mas ainda é cedo para fazer este tipo de comparações: em primeiro lugar ainda estamos na fase das primárias, pelo que Obama ainda tem poucos incentivos para avançar para o centro – vamos ver se a coisas mudam quando (e se) estiver sozinho face a McCain. Em segundo lugar, Reagan mudou completamente os termos do debate, algo que Obama ainda não fez. Recentemente foi publicado um livro que usa o exemplo de Reagan para ilustrar um dos conceitos mais interessantes da ciência política recente – “heresthetics” – um nome inventado por William Riker para descrever situações nas quais um político consegue mudar radicalmente os termos do debate. Hoje já nos esquecemos, mas Reagan lançou duas ideias que estavam completamente fora da agenda e que tinham conduzido a derrotas em anos anteriores – forte liberalização da economia (quando, parafraseando as palavras de Nixon, “todos eram Keynesianos” e as ideias de Goldwater eram mal recebidas nas urnas) e intensificação da retórica anti-soviética (numa altura em que se vivia a détente ou “normalização” no relacionamento entre as duas superpotências).

Até ao momento não ouvi Obama defender ideias e políticas que se possam comparar a estas em termos de afastamento do mainstream (não, “change” e “hope” não contam). Não quer dizer que o tenha que fazer para ganhar ou que não o venha a fazer – o ponto é que, pelo menos por enquanto, comparar Obama com Reagan é forçar a história.

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